Em “Tribos”, grandes papéis e cenas _e um Antonio Fagundes dedicado ao ofício
O melhor de “Tribos” está nos personagens, nos diálogos, enfim, em Nina Raine. A jovem autora inglesa, que tanto impressionou Antonio Fagundes, já havia demonstrado qualidades _e também deficiências_ em “Rabbit“, encenada um ano atrás em São Paulo, com Júlia Ianina e Nelson Baskerville como filha e pai.
Agora, “Tribos” é melhor, mais desenvolvida, como se Raine estivesse mais solta e segura de sua carpintaria, sobretudo na composição de personalidades. Ela se desenvolveu ao longo da última década no teatro Royal Court, inicialmente como diretora, à sombra difícil da geração “in-yer-face” de dramaturgos.
Nesta segunda peça, de três anos atrás, como na primeira, de 2006, trata-se de uma família disfuncional, em que o relacionamento _ou ausência dele_ entre pai e filho, no caso também irmãos, deixa sequelas insuportáveis para todos.
Embora o enredo se concentre no filho surdo, todos os três irmãos vivem pequenas tragédias, de mesma proporção. O teor político está mais no isolamento do surdo, feito com competência por Bruno Fagundes, secundado por sua namorada, também surda, vivida por Arieta Corrêa.
A mensagem quase política _contra o isolamento, a incapacidade de ouvir o outro, o preconceito_ está lá, devidamente expressa, em primeiro plano. Mas o grande momento é vivido pelo outro irmão, interpretado por Guilherme Magon, ator pouco conhecido, mas preciso e desconcertante.
A certa altura, ele rompe de tal maneira o isolamento em que o irmão era mantido que passa, ele próprio, à mudez. Antes já dava sinais de gagueira, mas o que vive no final é uma espécie de mimetização, como se se dispusesse a qualquer coisa para comprovar o amor fraterno.
A qualidade dos papéis e dos diálogos de “Tribos” possibilita cenas marcantes para o elenco e para o diretor Ulysses Cruz, apesar de suas opções tradicionalistas em cenário etc. Mas importa registrar também como Antonio Fagundes, que sai propositalmente do foco de luz, para deixar o filho, vive momento especial em sua longa carreira no teatro.
Como já havia demonstrado em “Vermelho”, no ano passado, ele está priorizando cada vez mais o ofício. Ainda mantém o olhar crítico, também a postura política, mas agora atento sobretudo à sua própria essência, no palco, na arte.
Aqui, o vídeo da entrevista que fiz com o grande ator.
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