Cachorrada

Lenise Pinheiro

Acompanhei as séries televisas que tinham cachorros como protagonistas, Lassie e Rin tin tin encantaram gerações e os desenhos Pluto, Snoopy e Scooby Doo, enterneceram as tardes de tantos. Diversão garantida até os dias de hoje.

Mas identificação total é com o Milú, o cachorrinho dos quadrinhos de Hergé. Inspirada numa publicação de As Aventuras de Tintim, muito antiga, minha avó paterna, confeccionou uma réplica. Na mesma época, a vitrola RCA Victor, exibia seu logotipo com um cachorro ouvindo um gramofone. Talvez essa imagem seja a pedra fundamental da minha ligação com as artes visuais.

A adoração pelos caninos se deu logo na infância e se esparrama pelos palcos, onde ao longo do tempo passo a retratar cachorros, protagonistas das mais diversas narrativas. Invariavelmente interpretados por humanos, “os cachorros” cativam de imediato. A fidelidade dedicada aos seus donos, sempre o mote de diferentes montagens. Criei apenas um cachorro, um fox paulistinha que roubou meu coração em meados da década de 80. Ele, que entrou pela porta da frente da casa de meus pais. Foi batizado Banzé e passou a protagonizar nossas reuniões familiares. A escolha do nome, perfeita. Era um azougue, de porte empertigado. Nos comunicávamos por silêncios e olhares. Sua ausência, sentida até hoje, é amenizada pelo tempo e pelos cãezinhos que passei a documentar.

Nos anos 90, sucesso absoluto, a TV Colosso do diretor Luiz Ferré, seguiu no topo das paradas, em toda sua trajetória. Os cachorrões, manipulados por técnicos e artistas, encantaram a todos.

Em 2008 enfrentei a ciumeira do Caxangá, mascote do Marcelo Drummond que desautorizava com latidos qualquer um que tentasse se aproximar de seu dono. Eu mesma encontrei bastante dificuldade para obter um clique seu em Vento Forte para Papagaio Subir, de Zé Celso.

O ator Leandro Daniel Colombo, dirigido por Moacir Chaves em Cachorro Manco, desenvolveu trabalho magistral, ao interpretar um cachorro mendigo, digno dos aplausos nas plateias do Sesc Paulista, ainda na fase provisória, em 2009.

Tempos depois, os atores Rui Xavier e Hévelin Gonçalves em 2012, discutiram a relação onde o marido, vitimado por traumas, foi se transformando em cachorro aos olhos da esposa e do público durante a apresentação do espetáculo onde se operava a transformação.

Em 2017, Marte Você Está Aí? de Michelle Ferreira. Marte, animal de estimação, deu vida às metáforas do mundo inanimado, na trama ficcional.

No elenco numeroso de Annie, estreia de 2018, destaque para a cena no final do musical, onde a paz era selada com entrada triunfal da cadela que roubava a cena em todas as apresentações.

Nesses últimos dias, muito se ouviu sobre o cachorro Eros que ao se desprender de seu dono foi parar na residência oficial da república.

Foi se juntar aos ocupantes dos Palácios do Alvorada e do Planalto em Brasília.

Tremenda cachorrada.