Veja texto e fotos de ‘Prato Feito de Teatro’

Lenise Pinheiro

Ouço Zé Celso cantar:

– “Só duas coisas tem valor na vida, comida e bebida, comida e bebida”. Versos viralizados em mim.

No teatro, cenas e apresentações em torno da mesa, transformam minha curiosidade em fotografia. Inspiração vinda dos roteiros se fiam nos diálogos que brotam entre refeições. Sugerindo enquadramentos obliterados, carnes do banquete são servidas frias, fatiadas. Vestígios e pegadas da Fernanda Torres, com teatro até o pescoço, sem jeito de corpo. Convocando-nos com o olhares, laivos e textos. Império das Meias Verdades, carregado e indigesto. Nesses ensaios, não foram poucas as vezes que meu apetite foi desperto ou irremediavelmente perdido.

Rins e fígados, no dizer do diretor Gerald Thomas.

Marco Nanini, mestre cuca. Filosofal.

Em A Cozinha, espetáculo quase sinfonia, tampas e panelas, regido pela turma da Escola de Arte Dramática, montagem dirigida por Iacov Hillel. E Luiz Paetow literalmente na ralação.

Onde a massa é batida, bolos são assados. Aroma para todos os gostos. Ao final da sessão Cibele Forjaz, Deborah Lobo, Mila Ribeiro e Tatiana Thomé, serviam assadeiras de teatro.

Duplo sentido, na mesa de Roberto Lage. Rita Malot comendo a carne crua. No teatro do Bexiga, dividindo azias com Walmir Santana, Nelson Peres e Roberson Lima.

Arguida, se tenho ganas de fotografar cenas atores e detalhes com comida?

– Eu grito: Sim!

No teatro aprendi a dizer sim.

Sim para a atriz Renina França que se veste de cacho de uva. Bacante praticante. Em O Misantropo.

Sim, para a Juliane Arguello e para o Marco Antonio Pâmio em Cobra na Geladeira,

Em meus registros, alimentos, bules e xicaras.

Tantos Tchekhovs, inúmeros samovars. Chás , infusões e catástrofes recorrentes, em cena aberta.

Regina Galdino transborda teatro no pires das atrizes, Agnes Zuliani, Clarisse Abujamra, Chris Couto e Selma Egrei.

As turca (essa era a grafia), da Andrea Bassit, Claudia Mello fazia quibe cru, servido em gamelas que se esparramam pelas paredes do cenário.

Me aproximei da culinária árabe, aprendi pratos e laços, com a Valéria Arbex, em Salamaleque.

Alexandre dal Farra sabe estragar um pudim. Pornoteobrasil é prova disso. Cenografia da Simone Mina, inspiração recorrente. Em Refúgio, a volta da aberração. Cardápio de alterar os sentidos na cena do André Capuano.

Outra criação de Gerald Thomas. Em Entredentes, sofisticação também se mastiga no teatro de Maria de Lima, Ney Latorraca e Edilson Botelho.

As indicações do texto de Black Bird seguidas à risca no Viga Espaço Cênico. Montagem de Cristina Cavalcanti e Nelson Baskerville.

Muito se sabe pelo olhar de Ana Cecília Costa dirigida por Mika Lins em A Tartaruga de Darwin. Um olho na salsicha e outro na plateia.

Convite para jantar, espetaculo de Eloisa Elena e Julia Ianina, sorteava uma pessoa da plateia para uma galinhada. Não fui contemplada. Sai do teatro para cozinhar, resultado jantar às duas da madrugada.

Meter a colher no teatro. No palco, o ovo para em pé.

Merda!