Atenção cenógrafos, a utilização de Amianto, foi proibida em SP, RJ, Rio Grande do Sul e Pernambuco
A primeira vez que fotografei um espetáculo que utilizava areia no cenário foi em 1988. A montagem, fazia parte da Trilogia Kafka, chama-se Praga e a cena em questão, encerrava a apresentação. Enquanto música e iluminação anunciavam o ápice da cena final, um balde fixado no urdimento do palco, assumia o protagonismo e despejava lentamente, grão por grão, uma fina camada de material aparentemente inefável, inodoro e inofensivo. Não era. A beleza incontestável, momento decisivo para fotografias, era um horror para os atores que compunham o quadro. Nos bastidores a cena era execrada pelos seus oficiantes, vim a saber momentos depois. Repare que a atriz à direita, se cobre com um véu escuro, o figurino foi improvisado para se proteger das “rajadas” de poeira que o colega, mais alto e com traje social completo, arremessava em seu rosto, com a aba de seu chapéu. À sua frente, o outro colega se curvava para a frente, também para se proteger e por final o ator que está deitado no chão, virou de bruços, mudando sua marca.
No ano seguinte, atendo o ator Marco Ricca ao telefone, ele solicitava um orçamento para que eu fotografasse sua atuação em Bakunin, no Teatro do Bexiga. Assim se deu meu reencontro com a temível companheira dos cenários deslumbrantes. A areia. Marco permanecia parte do espetáculo enterrado até o pescoço e assim foi. Qual não foi a minha surpresa, ao retomar a parceria com meu querido amigo e grande ator, ao fotografá-lo novamente em 1991, em Dois perdidos numa noite suja, num ringue de lama. A poeira agora seria contida, para atingir a textura exigida pela direção de arte. Narinas a salvo.
Houve o rumoroso caso da terra na primeira apresentação de “Ouviu-se um grito na montanha”, onde Pina Bausch se viu às voltas com formigas dançando nos pés dos bailarinos de Wuppertall. Foi preciso trocar o material para as apresentações seguintes.
Várias superfícies arenosas apareceram para mim. Cobri com afinco às apresentações revestidas por espessas camadas de terra batida, a poeira subia e tomava conta impregnando mucosas ao mesmo tempo que inebriava olhares.
Estive presente a inúmeros ensaios pisando em terrenos arenosos. Clicks com direito a balde de areia no final. Palcos entre o descuido e a poesia. Existem alternativas salutares. O arroz, por exemplo, não irrita mas…desperdiça. E para guardar os quase 200 quilos, a produção usava veneno, como conservante.
Superei o efeito apoplético em meu sistema respiratório, da terra utilizada em ocupações. Não esmoreci frente a poética das chuvas de areia, que despencavam do alto do pé direito, recentemente. Soube que os atores mantinham vaporizadores e inaladores, no camarim para darem conta de tanta plasticidade. Num trabalho em um teatro no centro de SP, há dez anos, contraí uma sinusite de grandes proporções, resultado do meu primeiro contato com a VERMICULITA, aqui grafado em caixa alta, para chamar a atenção pra seu alto grau de periculosidade, embora utilizada no cultivo orgânico, a vermiculita é uma forma muito tóxica de amianto.
Margaret Heffernan, em vídeo na internet, confirma e alerta. Dias desses fotografei outra peça com palco forrado por essa insidiosa substância. A atriz, numa das marcas, esfrega a poeira no rosto. Indaguei se ela não tinha nenhuma reação alérgica:
– “Estou com sinusite”.
Também fiquei. Levamos farelo, como diz o dito popular.
Elencos “bailam” literalmente sobre lama, terra e poeira. Nem sempre o material utilizado está apto para entrar em cena. Indagado, um diretor de arte, me disse:
– “VERMICULITA? É inofensiva”.
É nada! Conversando com uma atriz, noite dessas, ouvi:
-“Fizemos um teste com VERMICULITA. Era muito leve, não funcionou” .
Esses deram sorte!
Passei a tomar cuidados redobrados com superfícies arenosas em espaços fechados. Salas adaptadas e sem ventilação muitas vezes “prendem” a plateia, entre lufadas tóxicas de tinta fresca, solventes e químicas nocivas à saúde.
Escrevo esse texto para chamar a atenção de vocês. Nessa semana, a utilização do amianto foi proibida em São Paulo.
Sou pouco afeita à proibições mas, nesse caso é o jeito.
Obrigada.