Crítica: 5 X Comédia, em 2017, se arrisca por novos caminhos, com acertos e erros

Nelson de Sá

Nos anos 1990, “5 X Comédia” foi uma homenagem ao besteirol, o gênero que havia destampado o humor no fim da ditadura, com duplas se apresentando em pequenas salas de Rio e São Paulo. O mesmo que chegou depois a programas como “TV Pirata”.

Diferente do besteirol, já era então, nos anos 90, uma comédia crítica ao “mainstream”, ao estabelecido, mas ao mesmo tempo assimilada por ele. E agora é outra coisa.

“5 X Comédia”, em 2017, tem alguns grandes atores em cena, também novos autores, mas o vínculo com o gênero original, transgressivo, se perdeu. E parece ter se circunscrito de vez à classe média do Rio, tematicamente, hoje um ambiente cultural ainda mais atado à Globo.

Talvez em decorrência disso, o público que vai ao shopping ver o novo espetáculo não tem a juventude daquele que assistia nos anos 90 —ou o engajamento daquele que viu surgir, na ditadura, atores como Miguel Magno (1951-2009) e autores como Mauro Rasi (1949-2003), pioneiros do besteirol.

Apesar do nome, é preciso aceitar “5 X Comédia” como outra coisa, inteiramente. Codirigida por Monique Gardenberg, é visualmente mais apurada, até apolínea, com a cenografia de Daniela Thomas e Camila Schmidt, os figurinos de Cássio Brasil e a iluminação de Maneco Quinderé.

Um acúmulo de qualificação que, é preciso alertar, tromba de frente com a crônica precariedade técnica do Frei Caneca, que vem prejudicando produções seguidamente e quase inviabilizou uma das sessões acompanhadas.

São cinco monólogos sem relação entre si, um “line-up” de cinco comédias “stand up” —ainda que com personagens, não comediantes falando em nome próprio. Inevitavelmente, o espectador assiste como se fosse uma competição, para identificar atores e autores que se saem melhor.

Nas apresentações vistas, o prêmio vai para a dupla Bruno Mazzeo e Antonio Prata. Como já mostrara em “Sexo, Drogas e Rock’n’Roll”, de Eric Bogosian, o ator não perde tempo em cena; cada piada ganha um propósito, uma crítica ampliada, retrata uma angústia contemporânea.

O que só é possível porque já estava no autor: num misto de crítica social e autocrítica comportamental, Prata, que é filho de dramaturgo, transporta para o teatro o que seus leitores já conhecem semanalmente, do jornal.

A integração alcançada em “Nana, Nenê”, entre ator, autor e a encenação, não se repete em “Regras de Convivência”, com a dupla Lúcio Mauro Filho e Gregório Duvivier. O texto de Duvivier é ligeiro e desconexo, e a atuação de Mauro não cobre as lacunas. Nem a cenografia funciona.

Em “Arara Vermelha” e “Branca de Neve”, respectivamente, as atrizes Fabiula Nascimento e Debora Lamm fazem o melhor que podem —caracterização carregada— com os textos engraçados, mas esquemáticos, quadros humorísticos alongados, de Jô Bilac e Julia Spadaccini.

A grande revelação da peça é Thalita Carauta. Também com texto tópico e aparentemente limitante de Pedro Kosovski, as aflições de uma figurante chamada Underline, ela se revolta, se entrega, rasga a alma e perde o emprego.

Uma versão desta crítica circula na edição de 1º de abril de 2017 com o título “‘5 X Comédia’, em 2017, se arrisca por novos caminhos, com acertos e erros”