Caesar – Como Construir um Império
Nesta nova incursão em Shakespeare, cinco anos depois de “H.a.m.l.e.t.”, em que assinava só a dramaturgia, o diretor Roberto Alvim segue o original, mas adaptando amplamente.
“Caesar” está mais para uma edição de “A Tragédia de Júlio César”, cortada para 60 minutos —embora haja também acréscimos pontuais, sublinhando paralelos com a atualidade política no Brasil, por exemplo, ao falar em “democracia”.
E trata-se menos de Shakespeare, na encenação, na própria interpretação dos atores Caco Ciocler e Carmo Dalla Vecchia, que se revezam em papéis como Brutus, Cássio e Marco Antônio, e mais de uma criação musical inspirada por ele e quase intermitente.
É ela que dita a apresentação, com execução ao vivo de Vladimir Safatle, colunista da Folha. Marca compassada e dramaticamente a ação, lembrando uma trilha de filme, um “score”, e por vezes a sonoplastia de rádio, com o piano servindo até para percussão.
O protagonismo da música é sublinhado pela iluminação, que se concentra mais no pianista, inclusive em seus gestos e dramaticidade, do que na cena propriamente, que ocorre ao lado —esta na penumbra durante parte do tempo, característica do diretor da companhia Club Noir.
O próprio volume supera, seguidas vezes, as vozes dos atores. Estes, seguindo a marcação musical e a edição acentuada do texto, que destaca alguns diálogos e os discursos de Brutus e Marco Antônio, mantêm uma mesma vibração dramática ao longo do espetáculo, sem variedade maior de intenção e voz.
Na mesma direção, não se deve buscar na montagem as súbitas trocas de gênero próprias do autor, caso, em “Júlio César”, da cômica primeira cena, nas ruas de Roma.
A aproximação entre a trama e a política no Brasil atual é tênue, não é tópica. Dá-se mais na forma de ecoar a crescente radicalização política e insegurança —o que se percebe na música, na persistente tensão dramática abraçada pela encenação.
Uma versão desta crítica aparece na edição de 22 de setembro de 2015 com o título “Em versão enxuta de ‘Caesar’, tragédia de Shakespeare, música vira protagonista”