A proximidade do Nelson Rodrigues da fase final com Fernanda Montenegro e o Teatro dos Sete _de uma interpretação, como se diz, mais técnica_ mascara um pouco a amplitude dos personagens do dramaturgo.

Ele vai muito além do desenho redondo de seus protagonistas ou da precisão no diálogo, qualidades que ajudaram a reconhecer nele o grande mestre brasileira da carpintaria teatral. Seus personagens avançam em muitas direções.

Uma das vantagens deste centenário foi ver Zulmira na pele de uma atriz como Maria Luisa Mendonça, em “A Falecida“. Ela é o oposto, de certa maneira, de sua sogra _é casada com o cineasta Cláudio Torres, filho da grande atriz.

Na comparação usada por Paulo Francis há meio século, ecoando a divisão que sempre se faz entre Sarah Bernhardt e Eleonora Duse, ela estaria mais para Cacilda Becker do que para Fernanda Montenegro.

Sua Zulmira guarda pouca ou nenhuma relação com as anteriores, tanto no teatro recente como aquela do cinema. É engraçada e é dramática, como requer a “tragédia carioca”, mas talvez a melhor (única) descrição seja trágica.

Não me recordo de montagem nenhuma em que a trajetória da personagem se aproximasse tanto do suicídio. E seu desvario é realçado no contraste com o Tuninho contido, quase externo, espectador, de Rodrigo Fregnan.

Maria Luisa Mendonça parece conhecer bem o universo ao qual recorre, como atriz. Antes da conversa com o TV Folha, editada aqui, contou longamente uma cena que havia presenciado, de uma convulsão, um ataque epilético.

Foi no dia anterior, em meio a outra entrevista para televisão, quando um técnico caiu no chão, tremendo, e ela, em vez de assistir, socorreu. Na essência, a catarse por que passa Zulmira, em cena, não é diferente daquela.

A chance de ver essa rara interpretação de uma das grandes criações de Nelson Rodrigues vai só até domingo.