Cacilda https://cacilda.blogfolha.uol.com.br Blog de teatro Mon, 29 Nov 2021 21:38:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 ‘Boom!’ celebra teatro musical e anuncia o melhor do compositor de ‘Rent’ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/11/06/boom-celebra-teatro-musical-e-anuncia-o-melhor-do-compositor-de-rent/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/11/06/boom-celebra-teatro-musical-e-anuncia-o-melhor-do-compositor-de-rent/#respond Tue, 06 Nov 2018 10:00:10 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/I2K2432-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17535 Tick, Tick… Boom!
★★★
Teatro Faap, r. Alagoas, 903. Ter. e qua., às 21h. Até 12/12. R$ 60 a R$ 90. Classificação 12 anos.

A história é muito simples, mas bem costurada, as canções são de qualidade. Percebe-se logo por que Lin-Manuel Miranda, o criador do festejado “Hamilton”, resolveu transformar “Tick, Tick… Boom!” em filme.

O pequeno musical, que estreou formalmente em 2001, mas nasceu no palco como “monólogo rock” em 1990, parece estar sempre a um passo de “Rent” —o musical posterior e histórico de Jonathan Larson (1960-96), sobre o impacto da Aids numa comunidade de artistas.

Remete em parte aos mesmos tópicos e ritmos. De certa maneira, anuncia “Rent”, explorando a própria vida de Larson numa Nova York de quitinetes, da boêmia teatral que o cercou até morrer cedo, tornando sua trajetória tão romântica.

É quase uma trama de chegada à maturidade, “coming of age”, no caso, de alcance da vida plena como artista. E as suas primeiras composições já prometem, sobretudo aquelas que sobrepõem duas ou as três vozes.

Para tanto, conta com versões sonora e tematicamente precisas das letras, como é raro ouvir no teatro musical brasileiro, talvez por terem sido feitas pelos próprios atores Bruno Narchi e Thiago Machado.

A encenação se concentra no trio de intérpretes e nos quatro integrantes da banda. Não é produção de recursos para cenários etc., mas no que investe, ou seja, em seu foco nos atores e na música, o saldo é palpável.

A banda, com os solos de guitarra de Thiago Lima e a regência teatralmente atenta do tecladista Jorge de Godoy, responde à altura dos sonhos roqueiro-musicais de Larson.

No elenco, na apresentação que se viu, o início titubeante logo fica para trás e os três oferecem cenas memoráveis dos bastidores e das aflições do teatro, que são também deles, que vêm se firmando na cena musical.

Narchi e Machado, na sala mais intimista da Faap, dirigidos em interpretação e voz por Leopoldo Pacheco e Bel Gomes, mostram o quanto amadureceram e são capazes de se deixar arrebatar.

O resultado são quadros em que o elenco vai ao limite, cômica ou dramaticamente, de seus papéis e da trilha. Um deles, em que os três cantam juntos (“Sugar”, no original), é particularmente bem-sucedido, com Machado em estado de graça.

Mas o ápice da apresentação, com aquela que é obviamente sua melhor canção (“Come to Your Senses”), é tirado do próprio musical que o protagonista está compondo, no enredo.

Giulia Nadruz tem uma voz de calar o ambiente, com emoção, alcance, domínio. É especial, de cortar a respiração do espectador.

Mas “Boom!”, com todas as suas qualidades, deixa então um vazio. O que vem à mente, ao sair, é o que mais haveria de joia oculta em “Superbia”. É o nome do musical anterior e esquecido de Larson, que o célebre compositor Stephen Sondheim tanto elogiou e jamais foi montado —a não ser pela música cantada por Giulia.

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‘Elza’ celebra a voz de louva-a-deus e a rebeldia de Elza Soares https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/10/22/elza-celebra-a-voz-de-louva-a-deus-e-a-rebeldia-de-elza-soares/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/10/22/elza-celebra-a-voz-de-louva-a-deus-e-a-rebeldia-de-elza-soares/#respond Mon, 22 Oct 2018 04:00:17 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/elza-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17445 Elza
★★★★★
Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195. De qui. a sáb., às 21h; dom., às 18h. Até 18/11. Ingr.: R$ 15 a R$ 50. 14 anos.

 

O primeiro impacto de “Elza” é com as vozes das sete atrizes-cantoras, de timbres diversos, mas compondo um quadro à altura daquela que dá nome à peça. Na apresentação, a própria Elza Soares estava na primeira fileira e ao final saudou suas vozes, elas que choravam quase todas, no palco.

Quadros inteiros do espetáculo falam disso, de sua voz. Como escreve o dramaturgo Vinicius Calderoni no programa, a peça se passa na garganta de Elza.

Das sete, aquela mais próxima é a baiana Larissa Luz, convidada especialmente e que está no centro da representação da mítica cantora no palco. Não só pela garganta, pela voz de louva-a-deus, mas pela própria representação física, os gestos, o retrato da paixão e da revolta, é quem incorpora Elza.

Mas todas o fazem, de um jeito ou de outro, o que é uma das facetas que tornam o espetáculo tão singular na vertente dos musicais biográficos nacionais.

As atrizes de diversas partes do país, de Minas ao Rio Grande do Norte, têm todas os seus solos, de brilho extravagante. Não reproduzem, mas como que partem de Elza para viagens individuais.

Kesa Estácio, por exemplo, faz uma interpretação de “Dindi” que poucos conseguiriam imaginar. Laís Lacôrte se agiganta não apenas solando, mas em quadros nos quais sua voz surge ao fundo, em lamento pungente.

Entre as muitas cenas que arrebatam o público, levantando-se em rebelião ou se desfazendo em pranto, uma das mais inusitadas é aquela em que Guta Menezes deixa o espaço da banda e vem à boca de cena, também ela para um solo que expressa Elza.

Para além das vozes e da banda, talvez o impacto maior seja o diálogo que “Elza” alcança com a situação política presente. Muito do que Elza Soares enfrentou não é diferente do que se anuncia agora para o país.

Assim, cada nova cena é potencializada, ganha força, por exemplo, quando ela se vê atingida por comentário racista numa gravação. A personagem, sua própria trajetória, se ergue como mito de resistência. A emoção das atrizes no final, diante dela, foi em grande parte derivada disso, do que a cantora representa.

Há momentos em que “Elza” entra no relato linear, biográfico, porque é isso o que se tem —sua biografia. A diferença é que, no caso, é uma trilha de obstáculos monumentais e ainda vivos.

E o retrato da mulher negra vai além da superfície política. A relação da personagem com o pai, com Mané Garrincha e com o filho que perde, seus três homens, é o fio que puxa a trama emocional, e as tragédias deles são as suas.

É um musical com letras e diálogos emocionalmente carregados. Com passagens como o casamento forçado aos 12, a proclamação de sua origem como “planeta fome” para Ary Barroso, o alcoolismo e a violência de Garrincha, a morte do filho.

E tudo culmina em duas canções recentes, em apoteose de rebeldia, “A Carne” e “Mulher do Fim do Mundo”, confirmando aquilo que é pronunciado ao longo do texto, de que Elza renasce todo dia. O que aconteceu era só ensaio para o agora.

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Novo ‘Fantasma’ tenta levar o pop de Andrew Lloyd Webber à ópera https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/10/08/novo-fantasma-tenta-levar-o-pop-de-andrew-lloyd-webber-a-opera/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/10/08/novo-fantasma-tenta-levar-o-pop-de-andrew-lloyd-webber-a-opera/#respond Tue, 09 Oct 2018 00:36:59 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/08/I2K3618-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17365 O Fantasma da Ópera
★★★
Teatro Renault. Av. Brig. Luís Antônio, 411, tel (11) 4003-5588. Qua., qui. e sex., às 21h; sáb., às 16h e 21h; dom., às 15h e 20h. Até 23/12. Ing.: R$ 75 a R$ 300

Como sempre nas versões de “O Fantasma da Ópera” derivadas da direção original de Harold Prince, esta mais recente é suntuosa, das cortinas ao elefante. Retrata em cores exageradas os bastidores de um teatro romântico.

Mas ao mesmo tempo é um pouco diversa, mais contemporânea. Aparenta uma inspiração mais livre do que de costume, em se tratando do tão repisado musical do hoje barão Andrew Lloyd Webber.

Do célebre golpe do lustre ao rio de gelo seco —aquele que o crítico Frank Rich chamou de “a visão do inferno por Liberace”— está tudo lá, bem realizado e um bocado “kitsch”, mas não é mais o centro da apresentação.

“Fantasma” se volta para as vozes, sobretudo do triângulo central de Thiago Arancam (Fantasma), Lina Mendes (Christine) e Fred Silveira (Raoul). Explora mais as pontes lançadas pelo compositor na direção das óperas populares do que a interpretação teatral.

O protagonista é a indicação mais evidente disso. Arancam, tenor que a produtora foi buscar na cena operística, quando canta não se consegue concentrar em mais nada. Ele preenche a atenção do público.

Mas quando cai nos diálogos sérios, “straight”, ele não sabe o que faz. Agita as mãos, distribuindo gestos espalhafatosos, obviamente tomando por referência a atuação de Michael Crawford, que criou o papel com mãos para todo lado —como visto no fim dos anos 1980, na Broadway.

O lendário Crawford, dirigido por Prince, incorporou o teatro romântico ao próprio papel. Arancam, que não pode ainda ser descrito como um ator pleno, incorpora antes a ópera, procurando elevar as canções pop de Webber.

Já Silveira é ator bem mais experiente em teatro musical, mas seu Raoul é um papel menos desenvolvido na trama. O resultado é que as cenas de romance, tão necessárias para a peça, têm efeito restrito.

“Fantasma” só não é mais frustrante porque a soprano Lina Mendes, também tirada na ópera, é atriz natural, concentrada nas interações e com amplitude dramática —até dançar ela consegue e bem. Segura as pontas, com amantes tão distantes.

Sua Christine os acompanha e sustenta nos duetos de forma envolvente, como a jovem vulnerável, a heroína romântica, um joguete nas mãos dos dois homens —desta vez, especialmente cruéis. A fragilidade está expressa no seu próprio corpo delicado, indefeso, esteja ela cantando ou não.

Também cantores originalmente de ópera, Bete Diva, como a soprano Carlotta, e Cleyton Pulzi, como o tenor Piangi, se saem igualmente bem tanto na interpretação vocal como nas diversas passagens de alívio cômico do musical.

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Aline Deluna revive Josephine Baker da sensualidade ao ativismo https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/como-num-cabare-aline-deluna-entra-o-corpo-de-josephine-baker/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/como-num-cabare-aline-deluna-entra-o-corpo-de-josephine-baker/#respond Mon, 10 Sep 2018 13:00:01 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/josephinebaker-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17191 Josephine Baker, a Vênus Negra
★★★
Sesc 24 de Maio. Rua 24 de Maio, 109. Qui. e sex., às 21h; sáb., às 18h30 e 21h; dom., às 18h. Até 16/9. R$ 40

Remetendo à origem de palco da própria Josephine Baker (1906-75), o espetáculo biográfico é como uma revista simplificada em que a interlocução da personagem e da atriz que a interpreta com o público é intermitente, como num cabaré.

Começa antes mesmo da apresentação, com Aline Deluna conversando no meio do público que espera para entrar na sala. Depois, na noite fria de São Paulo, a atriz faz rir e emociona, mesmo com diversas canções em francês e não necessariamente conhecidas.

Envolve em parte com as pontes que são lançadas para o Brasil, sobretudo para o Rio que Josephine visitou diversas vezes e no qual deixou marca. A cena em que rememora um quadro musical ao lado de Grande Otelo, no caso, interpretado pelo pianista Jonathan Ferr, é um dos momentos em que o elo com o país se faz mais próximo.

Seu espírito carnavalesco, colado ao rigor na dança e principalmente no canto, vale tanto para a personagem como para a intérprete, que é envolvente, carismática.

Talvez pelas temporadas já cumpridas no Rio, a integração entre ela e os três músicos transformados em atores é uma das qualidades do espetáculo. Violonista, baterista e pianista são parte ativa da apresentação e respondem à altura da protagonista, tocando com precisão e desenvoltura e arriscando até improvisação e “cacos” de texto.

Não é um espetáculo derivado da Broadway, embora a personagem tenha tido carreira também em Nova York. É antes um trabalho de influências francesas e brasileiras, nas canções, na forma.

Como a protagonista sublinha, a plateia tem todas as cores lado a lado, o que era proibido em grande parte dos EUA quando Josephine surgiu. Aline a retrata ou espelha em muitas de suas facetas, por exemplo, no ativismo persistente de combate ao racismo americano.

Mas é noutro ponto, na forma aparentemente resolvida com que lida com o próprio corpo, aquilo que mais a aproxima da personagem: na nudez sem apelação, quase naturista, e também na sensualidade sem constrangimento.

Dirigido por Otávio Müller, o musical tem como cenário o palco aberto, com coxias à mostra, inclusive o trabalho da camareira, que veste e despe a protagonista em cena, em aparente homenagem à primeira função que Josephine recebeu no teatro.

Nem tudo dá certo. Abrir com uma canção como “Minnie the Moocher”, de Cab Calloway, se mostra referência distante demais para iniciar a mobilização da plateia.

E a trama, como outras biografias do teatro musical brasileiro recente, se sustenta em pesquisa detalhista e apresenta uma linearidade cronológica de efeito dramático questionável. Talvez resultado dessa bitola algo rígida, sente-se a ausência de quadros mais desenvolvidos, feéricos como a personagem.

Mas a ideia não parece mesmo ter sido buscar um musical grandioso, do Folies Bergère onde Josephine Baker ganhou renome, e sim de participação, diálogo com a plateia, o que faz com eficiência.

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‘Natasha’ traz de volta o melhor de Bruna Guerin e Zé Henrique de Paula https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/natasha-traz-de-volta-o-melhor-de-bruna-guerin-e-ze-henrique-de-paula/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/natasha-traz-de-volta-o-melhor-de-bruna-guerin-e-ze-henrique-de-paula/#respond Mon, 10 Sep 2018 05:00:33 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/natasha-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17187 Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812
★★★★
033 Rooftop, JK Iguatemi. Av. Juscelino Kubitschek, 2.041. Sex., às 21h30; sáb., às 16h e 21h30; dom., às 19h30. Até 25/11. R$ 130 a R$ 160. Menu completo: R$ 133

Nesta adaptação para musical de uma passagem de “Guerra e Paz”, a agora estrela Bruna Guerin tem algumas das melhores cenas de sua carreira, de maior arrebatamento, no papel de Natasha, heroína que se deixa levar pela paixão e é punida por ela.

Passa com facilidade da descrição narrativa, uma das características deste musical, para a emoção plena. Vai do distanciamento para a fusão com a personagem, com um estágio potencializando o outro.

Amadurecida, com controle sobre a própria interpretação tanto vocal quanto emocional, a atriz conduz os diálogos mais conflitantes com segurança, entre a jovialidade inicial e o posterior desespero, que a aproxima do suicídio.

O coprotagonista André Frateschi, que faz Pierre, não chega a tanto, talvez por ser menos experiente na atuação, propriamente. Apesar de filho de atores, dedica-se mais à música. Seu personagem passa boa parte da peça monocordicamente mal-humorado, sem que precisasse se prender assim.

Mas no final, quando o papel ganha um propósito mais claro, o intérprete se concentra e, cantando sempre bem, faz um dueto final emocionante com Bruna.

E acrescenta na sequência a redenção do cometa que toma os céus de Moscou e trará horrores, mas que naquele instante prenuncia a paz, o fim da dor e do desalento. Como um instante de silêncio, antes da tempestade.

Não se trata, que fique claro, do romance avassalador de Tolstói, talvez o mais grandioso já escrito, mas de um pequeno recorte dele. É tão leve, se comparado ao original, que pode soar ofensivo, daí o aviso ao leitor.

Zé Henrique de Paula, diretor de maior produção no teatro paulistano recente, está aqui novamente com a sua própria companhia, aquela que levou ao palco o exitoso “Urinal”, outro musical de risco buscado no cenário alternativo de Nova York.

Desta vez, põe em cena a sua diretora musical, Fernanda Maia, tocando e regendo no centro do palco. Transforma a execução musical ela própria em espetáculo.

Do que se conhece, é a encenação mais inventiva da companhia, com um palco que serpenteia no meio do público, com direito a comida russa, se o espectador pedir —como que ensinando o que seria possível conseguir de integração ao teatro em salas assim, como tantas que existem em São Paulo, mas quase sempre com logística desastrosa.

Um terceiro protagonista, Gabriel Leone, que faz Anatol, se sai melhor do que o seu personagem —vaidoso, oportunista, desrespeitoso— indica. A paixão que arranca de Natasha, em duetos emocionantes, quase mágicos, é também dele. A repulsa que provoca é vencida por um sorriso e uma dor que vão além do papel.

Mas a melhor cena, uma celebração da Rússia, é a protagonizada pelo cocheiro de Anatol, Balaga (Vitor Moresco). Comandado por ele, a passos violentos, o elenco inteiro transmite um vigor que parece arriscar fisicamente tanto os atores como os espectadores.

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‘Zeca Pagodinho’, mais que teatro, faz samba-exaltação https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/20/zeca-pagodinho-mais-que-teatro-faz-samba-exaltacao/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/20/zeca-pagodinho-mais-que-teatro-faz-samba-exaltacao/#respond Fri, 20 Jul 2018 13:27:06 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/VY8A3554-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17065 Zeca Pagodinho – Uma História de Amor ao Samba
★★★
Teatro Procópio Ferreira – rua Augusta, 2.823, tel. (11) 3083-4475, São Paulo. Qui. e sex., às 21h; sáb., às 17h e às 21h; dom., às 17h. Até 5/8. R$ 40 a R$ 80. 12 anos

O problema flagrante do espetáculo é que não se trata de um personagem, não se trata propriamente de teatro, mas de um samba-exaltação, de um musical feito para celebrar um herói sem falhas. Ele talvez seja de fato um ser humano próximo da perfeição, mas é preciso mais do que isso para se tornar personagem de teatro.

Por exemplo, ao tratar de alcoolismo, o fato ou a lenda de que bebe demais é abordado como brincadeira, mais um traço de seu caráter insubordinado. Uma década atrás, até um papel de telenovela inspirado nele, Zé da Feira, conseguia ser mais questionador e aprofundar minimamente o impacto do alcoolismo.

Se o objetivo era erguer uma fábula, como expresso pelo autor, diretor e protagonista Gustavo Gasparani, essa é uma lição de moral que se perde pelo caminho. O resultado é em grande parte um espetáculo que engaja pouco, uma trama sem quedas, sem incertezas, que foge ao menor sinal de conflito.

Samba-exaltação é um gênero de música que nasce no Estado Novo, para cantar maravilhas de fachada. E a moral da história, em “Uma História de Amor ao Samba”, é que embora viva na Barra da Tijuca —porque, garante o texto, é um pai de família que prioriza o estudo dos filhos— ele volta sempre que pode a Xerém, onde já morou.

Ou seja, é preciso seguir o exemplo de sucesso e respeitar as suas raízes, organizar rodas de samba, não se vender. Mas o resultado cênico da lição é que Xerém, na Baixada Fluminense, acaba retratado como o Rio de Janeiro edênico dos sambas-exaltação de Ary Barroso.

Registre-se por outro lado que, com artistas qualificados na produção, o espetáculo consegue evitar algumas das piores armadilhas dos musicais de linha parecida.

Por exemplo, opta claramente por não explorar a figura da mulata. As mulheres estão no palco para atuar, cantar, algumas com performances encantadoras, e não para figuração de turista.

Nessa trilha, a interpretação e execução das canções e a própria caracterização do protagonista, tanto jovem, por Peter Brandão, como mais velho, por Gasparani, estão matizadas, com uma complexidade que a trama em si não contém ou incentiva.

A começar da adoção de uma dupla cômica vestida de Cosme e Damião para os números de cortina, o musical remete à estrutura frágil do teatro de revista. As piadas que têm para contar não são das melhores, mas Hugo Kerth e Édio Rodrigues saem-se bem na função, costurando com graça e cumplicidade os quadros musicais.

Vindo de temporada no Rio, “Uma História de Amor ao Samba” chega com ritmo, com cenas amadurecidas o quanto podiam. Mas é preciso ser fã, conhecedor até das letras menos festejadas, para embarcar neste show.

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‘Banda Navalha, um Espanto!’ revive explosão musical vinda de Londrina https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/02/banda-navalha-um-espanto-revive-explosao-musical-vinda-de-londrina/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/02/banda-navalha-um-espanto-revive-explosao-musical-vinda-de-londrina/#respond Mon, 02 Jul 2018 05:00:35 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/navalhalenise-320x213.jpg http://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17019 Banda Navalha, um Espanto!
★★★★
Apresentação única realizada na sexta (29) no Sesc Belenzinho, em São Paulo.

“Banda Navalha, um Espanto!” é, em grande parte, uma celebração de Itamar Assumpção (1949-2003), começando com um documentário de poucos minutos falando sobre ele “antes de Nego Dito”, da criação de seu personagem mais conhecido, na canção de mesmo nome.

Mostra os seus primeiros passos como ator em Arapongas e Londrina, sob a direção da mulher de teatro Nitis Jacon, as primeiras apresentações com a irmã, Denise, e com Neuza Pinheiro e, principalmente, as lembranças de Arrigo e seu irmão Paulo Barnabé.

O que se segue é um espetáculo que também explora sua forte ligação pessoal e musical, desde muito cedo, com Arrigo, Paulo e as duas, Denise e Neuza, no Paraná. É o Pessoal do Paraná, como brinca Arrigo, sempre irônico, remetendo ao Pessoal do Ceará da época —e distanciando-se do rótulo, que de fato soa inadequado, de Vanguarda Paulista.

Curiosamente, o “musical” é menos teatral do que aqueles protagonizados pelos mesmos Arrigo e Itamar no começo dos anos 1980, em São Paulo, nos quais criavam e interpretavam personagens em suas músicas e na encenação.

Itamar, sobretudo: Seus shows eram marcadamente performáticos, tanto na interpretação como nos figurinos, cenários e nas participações de Denise. Esta se dividia, então, com o início da carreira teatral paulistana, no “Macunaíma” de Antunes Filho.

Agora, é ela quem traz à cena o personagem Itamar, ao surgir em figurino masculino para interpretar algumas das músicas mais conhecidas do irmão. Chega a brincar com uma espectadora, que reconhece ao entrar pela plateia, apontando para o palco: “Itamar estava lá, você viu?!”.

Denise faz o irmão e evoca também, inevitavelmente, a sua própria forte presença naqueles shows, mais de três décadas atrás.

Como lembra Neuza ao descrever seu primeiro encontro com os irmãos Itamar e Denise, ainda na entrada dos anos 1970, eles eram como príncipes negros, imponentes, longilíneos. Mais, eram filhos de pai-de-santo que, desde cedo, tomaram parte nas celebrações no terreiro, carregando desde então —Denise, até hoje— a capacidade de ritualizar a cena com carisma e música.

Em “Navalha”, acumulam-se diferentes quadros, como numa revista que ainda precisa passar pelas mãos de um dramaturgo e de um diretor para ganhar unidade.

O que integra os quatro fluxos diversos de memórias e canções em cena, primeiro o exuberante Arrigo, depois a suave Neuza, o suingue de Denise-Itamar e por fim o roqueiro Paulo, idealizador do espetáculo, é o virtuosismo da banda.

Mario Manga no violoncelo e depois na guitarra, Paulo Lepetit no baixo e Vitor Cabral na bateria conseguem alinhavar, dar unidade, ao que poderia ser disparatado, narrativa e musicalmente. De certa maneira, são eles que festejam e incorporam a banda Navalha do título, que Arrigo, Itamar e Paulo tentaram montar em São Paulo antes de partirem para projetos próprios.

Sobre Neuza Pinheiro, “Navalha” deixa claro que foi ela quem estabeleceu o padrão de interpretação, quase uma década antes, para as cantoras que fizeram história em palcos como Lira Paulistana.

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Agora protagonista, Malu Rodrigues dá o tom e sustenta ‘A Noviça Rebelde’ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/05/04/agora-protagonista-malu-rodrigues-da-o-tom-e-sustenta-a-novica-rebelde/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/05/04/agora-protagonista-malu-rodrigues-da-o-tom-e-sustenta-a-novica-rebelde/#respond Fri, 04 May 2018 05:00:53 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=16883 CRÍTICA

“A Noviça Rebelde” se sustenta em grande parte na protagonista, na voz de Malu Rodrigues.

É uma encenação acentuadamente religiosa e tradicionalista, que consegue ser mais antiquada que o filme de 1965. A leveza que se permite está na Maria de Malu, agora —e cada vez mais— com amplitude de atriz, não só cantora, e em sua relação com as crianças menores.

De resto, o humor desta nova produção embarca até em vulgarização preconceituosa da homossexualidade. E a encenação mergulha numa suntuosidade que não condiz com a música original, de 1959, de Richard Rodgers e Oscar Hammerstein II.

O kitsch pomposo, de uma Broadway de caricatura, parece marcar uma nova fase do diretor Charles Möeller e do versionista Cláudio Botelho. O que havia de alegre e efusivo na dupla brasileira ficou pelo caminho, trocado por um conservadorismo amargo.

Mas se trata de uma das cinco grandes criações de Rodgers e Hammerstein, a dupla de compositor e letrista que mudou o musical americano, tornando-o mais complexo. E é aquele com mais “standards”, canções que marcam até hoje, entre elas “The Sound of Music”, “Do-Re-Mi”, “My Favorite Things” e “Edelweiss”.

A produção, aliás, perdeu a chance de recuperar o título “O Som de Música”, mantendo o que foi usado para o filme, “A Noviça Rebelde”. A opção sublinha a história, o libreto de Howard Lindsay e Russel Crouse, de longe sua faceta menos qualificada.

O roteiro é não só melodramático na forma, indo contra as mudanças de Rodgers e Hammerstein no gênero, mas reacionário no conteúdo. A crítica que faz ao nazismo se apoia no nacionalismo e no militarismo austríacos —sem questionar autoritarismo ou racismo.

A produção carrega ainda mais nas tintas sombrias, católicas, com os cenários de David Harris, os figurinos de Simon Wells e o coro de freiras.

Outro problema está no elenco principal. O teatro Renault foi o palco da retomada dos musicais no Brasil, com produções que formaram público e uma geração de estrelas do gênero, não celebridades emprestadas.

“A Noviça Rebelde”, agora, retrocede ao que o teatro comercial tem de pior no país, o apelo a atores de telenovela. É como se os musicais, até no palco que provou a sua viabilidade, não conseguisse mais andar com as próprias pernas.

O protagonismo de Gabriel Braga Nunes e Larissa Manoela no musical ecoa a projeção em folhetins de TV. Ambos têm qualidades já provadas no teatro, mas até Nunes deixa a insegurança à vista quando precisa soltar a voz.

Resta Malu Rodrigues, 24. Com uma década de trabalho em musical, iniciada como Louisa numa produção anterior de “A Noviça Rebelde” pelos mesmos Möeller e Botelho, ela segura o espetáculo. É quem dá o tom para os outros protagonistas. Bela, sensual, confiante e com aquelas notas altas, faz esquecer os deslizes.

A NOVIÇA REBELDE

★★★

Qua. a sex., às 21h; sáb., às 16h e 21h; dom., às 15h e 20h. Teatro Renault, av. Brig. Luís Antônio, 411, tel. (11) 4003-5588. R$ 75 a R$ 310. Livre

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Crítica: Divertido e inventivo, ‘Peter Pan’ abre temporada musical https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/03/27/critica-divertido-e-inventivo-peter-pan-abre-temporada-musical/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/03/27/critica-divertido-e-inventivo-peter-pan-abre-temporada-musical/#respond Wed, 28 Mar 2018 01:50:03 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=16703 Nelson de Sá

Como escreveu o crítico Brooks Atkinson em 1954, sobre a estreia da adaptação musical americana para a peça inglesa de J.M. Barrie, é um espetáculo “enormemente divertido”.

Na encenação brasileira, talvez até mais —com voos ameaçadores sobre a plateia, de um Peter Pan acrobático agora feito por um ator, não atriz, e com jacaré mecânico. Uma superprodução para os padrões paulistanos e até para a Broadway original.

E tanta engenhosidade espetacular, devida em parte à produtora Renata Borges, mais participativa que o costume no Brasil, ainda assim é sobrepujada pela liberdade que encenação e elenco se permitem.

Atkinson, no New York Times, saudou em especial a “inventividade e delícia” com que o diretor e coreógrafo Jerome Robbins havia criado seus balés cômicos.

Pode-se afirmar o mesmo do diretor José Possi Neto e do coreógrafo Alonso Barros, que, a cada cena, parecem mais tomados pelo desejo de ombrear com o hoje lendário Robbins (1918-98).

O que fazem com Uga Uga, o segundo quadro do segundo ato, é talvez a melhor resposta contemporânea ao que o texto traz de mais datado —seu retrato preconceituoso dos índios americanos.

Não se escondeu nada, mas o delírio de movimentos que o Peter Pan de Mateus Ribeiro e sobretudo a Tiger Lily de Carol Botelho comandam no palco, na cena bastante estendida e que parece envolver todo o elenco, é avassalador, empolgante.

O público começa a aplaudir no meio do quadro, as crianças gritam, como se quisessem entrar no ritual frenético, quase um show à parte, com coreografias e arranjos que remetem para todo lado, cumulativamente.

A cena não deve ser creditada só a Possi, Alonso e seus 32 atores, mas também ao diretor musical Carlos Bauzys, costurando uma apoteose como poucas vezes se assistiu no gênero, no país.

E tem mais, em sofisticação criativa local, neste “Peter Pan – O Musical da Broadway”, na denominação usada no programa. Daniel Boaventura parece ter ido buscar nos seus primórdios no teatro, em plena comédia musical baiana dos anos 1980 e 90, as chaves para fazer do Capitão Gancho a estrela cômica da noite.

Suas cenas são ansiadas pelo público não só pela celebridade que ele alcançou nos musicais brasileiros mas pelo que abraça de humor desabrido e popular, desde a primeira aparição.

Não é possível mensurar o quanto Boaventura e seu “sidekick”, o agitado e engraçadíssimo Smee de Pedro Navarro, carregam da pantomima que inspirou J.M. Barrie (“panto”, a tradicional comédia popular inglesa, não simplesmente mímica), mas ela está presente na dupla.

Navarro e Carol Botelho são dois dos vários intérpretes de segundo plano ou do coro que parecem ascender por vezes à posição de protagonistas, dada a qualidade abundante no espetáculo, mas Bianca Tadini está sempre lá.

Mais que Peter, é sua Wendy que leva o público pela mão ou, melhor, pela voz, a mais aconchegante, afetuosa. Embala as crianças que se esforçam para chegar acordadas ao final das quase três horas da apresentação.

PETER PAN, O MUSICAL

QUANDO qui. e sex., às 20h30, sáb., às 16h e 20h, dom., às 17h; até 15/7

ONDE Teatro Alfa, r. Bento Branco de Andrade Filho, 722, tel. (11) 5693-4000

QUANTO R$ 50 a R$ 210

AVALIAÇÃO ótimo ★★★★★

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