Cacilda https://cacilda.blogfolha.uol.com.br Blog de teatro Mon, 29 Nov 2021 21:38:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Guilherme Leme mergulha ‘Romeu e Julieta’ no pop e escapa com vida https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/09/09/guilherme-leme-mergulha-romeu-e-julieta-no-pop-e-escapa-com-vida/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/09/09/guilherme-leme-mergulha-romeu-e-julieta-no-pop-e-escapa-com-vida/#respond Mon, 10 Sep 2018 01:19:16 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/romeuejulieta-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17182 Romeu + Julieta – Ao Som de Marisa Monte
★★★★
Teatro Frei Caneca. R. Frei Caneca, 569. Sex., às 20h30; sáb., às 16h e 20h; dom., às 19h. Até 21/10. R$ 75 a R$ 200

A encenação se inspira, como evidencia o próprio nome-marca que adota, em “Romeo + Juliet”, um dos melhores filmes de Baz Luhrmann e talvez a versão contemporânea mais bem-sucedida, ao menos em aceitação do público, de Shakespeare.

A ideia é reunir música pop —bandas como Cardigans e Radiohead no caso do filme de 1996, Marisa Monte no musical brasileiro— com alguns dos diálogos, das falas mais emblemáticas da tragédia.

O resultado, como no filme, é desigual, por vezes levando a peça a perder ritmo. A trama original, das mais envolventes de Shakespeare, precisa ceder lugar às canções do “universo” da cantora —e, mais do que acontecia no filme, nem todas fazem sentido. Algumas letras têm enredo conflitante.

De qualquer maneira, o musical alcança seu intento de aproximar mais a peça do público brasileiro, ainda que muito cortada, inclusive cenas que o filme havia mantido.

Um dos trunfos deste “Romeu + Julieta” é a protagonista Bárbara Sut, sobretudo pela voz, pela interpretação das canções. Ela escapa com vida da comparação inevitável com a cantora: é também tocante e de timbre semelhante e ao mesmo tempo explora variantes próprias para os hits.

No papel de Julieta, poderia buscar maior diversidade de interpretação, de início concentrada em uma alegria infantil, posteriormente se voltando por inteira para lágrimas e drama.

É eficiente em ambos, mas sem aproveitar a fundo as alternâncias e a perspicácia que o próprio texto sugere para a personagem. O autor abraçava um teatro popular e variado, em que a tragédia e a comédia, mesmo neste que teria sido um de seus primeiros textos, conviviam a cada cena.

O Romeu de Thiago Machado consegue maior equilíbrio entre interpretação musical e atuação, ainda que sem o carisma da coprotagonista —e ainda que seu personagem seja sabidamente mais restrito.

Mas o principal é que a dupla, o jovem casal, tem o que se costuma chamar de química e convence em sua paixão juvenil, algo descontrolada, quase um autoengano, que é o coração da peça —em contraste com a divisão política de suas famílias, que corrói a cidade-estado de Verona.

Outros desempenhos são especialmente felizes, caso da ama de Stella Maria Rodrigues, que se sai bem na porção musical e, pelo humor, conquista o espectador desde seu primeiro passo no palco.

É mais engraçada e inteligente do que costuma acontecer com a personagem noutras montagens contemporâneas. É possível ver nela um pouco da colaboração artística de Vera Holtz na produção, mas é principalmente o timing, o vaivém surpreendente que Stella consegue no papel o que a faz sobressair tanto.

O frei Lourenço de Glaudio Galvan também é engraçado como requer seu personagem, mas é dele o quadro mais forte, propriamente musical, que fecha o primeiro ato.

É o casamento de Romeu e Julieta, que ele sagra cantando a música “Vilarejo”, uma das tantas letras que pouco têm a ver com a cena, mas nesse caso não importa. Tanto a mise-en-scène criada por Guilherme Leme como a direção musical de Galvan e do coro por Apollo Nove alcançam aos poucos um sentimento de graça, marcadamente religioso.

Elementos de cenário, figurino e iluminação, tanto nessa cena como naquela da despedida de Romeu e Julieta, compõem imagens de impacto, contrastando as torres de pedra com os corpos dos dois protagonistas —e os panos e focos de luz que os estendem.

As cenas confirmam o êxito buscado por Leme com colaboradores da qualidade de Holtz e da cenógrafa Daniela Thomas, do figurinista João Pimenta, da iluminadora Monique Gardenberg e do adaptador Gustavo Gasparini.

Como confirma a casa lotada, o musical é de apelo popular, devido em parte aos hits de Marisa Monte, mas também ou principalmente ao original, como reencontrado pelo diretor.

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‘Zeca Pagodinho’, mais que teatro, faz samba-exaltação https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/20/zeca-pagodinho-mais-que-teatro-faz-samba-exaltacao/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/20/zeca-pagodinho-mais-que-teatro-faz-samba-exaltacao/#respond Fri, 20 Jul 2018 13:27:06 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/VY8A3554-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17065 Zeca Pagodinho – Uma História de Amor ao Samba
★★★
Teatro Procópio Ferreira – rua Augusta, 2.823, tel. (11) 3083-4475, São Paulo. Qui. e sex., às 21h; sáb., às 17h e às 21h; dom., às 17h. Até 5/8. R$ 40 a R$ 80. 12 anos

O problema flagrante do espetáculo é que não se trata de um personagem, não se trata propriamente de teatro, mas de um samba-exaltação, de um musical feito para celebrar um herói sem falhas. Ele talvez seja de fato um ser humano próximo da perfeição, mas é preciso mais do que isso para se tornar personagem de teatro.

Por exemplo, ao tratar de alcoolismo, o fato ou a lenda de que bebe demais é abordado como brincadeira, mais um traço de seu caráter insubordinado. Uma década atrás, até um papel de telenovela inspirado nele, Zé da Feira, conseguia ser mais questionador e aprofundar minimamente o impacto do alcoolismo.

Se o objetivo era erguer uma fábula, como expresso pelo autor, diretor e protagonista Gustavo Gasparani, essa é uma lição de moral que se perde pelo caminho. O resultado é em grande parte um espetáculo que engaja pouco, uma trama sem quedas, sem incertezas, que foge ao menor sinal de conflito.

Samba-exaltação é um gênero de música que nasce no Estado Novo, para cantar maravilhas de fachada. E a moral da história, em “Uma História de Amor ao Samba”, é que embora viva na Barra da Tijuca —porque, garante o texto, é um pai de família que prioriza o estudo dos filhos— ele volta sempre que pode a Xerém, onde já morou.

Ou seja, é preciso seguir o exemplo de sucesso e respeitar as suas raízes, organizar rodas de samba, não se vender. Mas o resultado cênico da lição é que Xerém, na Baixada Fluminense, acaba retratado como o Rio de Janeiro edênico dos sambas-exaltação de Ary Barroso.

Registre-se por outro lado que, com artistas qualificados na produção, o espetáculo consegue evitar algumas das piores armadilhas dos musicais de linha parecida.

Por exemplo, opta claramente por não explorar a figura da mulata. As mulheres estão no palco para atuar, cantar, algumas com performances encantadoras, e não para figuração de turista.

Nessa trilha, a interpretação e execução das canções e a própria caracterização do protagonista, tanto jovem, por Peter Brandão, como mais velho, por Gasparani, estão matizadas, com uma complexidade que a trama em si não contém ou incentiva.

A começar da adoção de uma dupla cômica vestida de Cosme e Damião para os números de cortina, o musical remete à estrutura frágil do teatro de revista. As piadas que têm para contar não são das melhores, mas Hugo Kerth e Édio Rodrigues saem-se bem na função, costurando com graça e cumplicidade os quadros musicais.

Vindo de temporada no Rio, “Uma História de Amor ao Samba” chega com ritmo, com cenas amadurecidas o quanto podiam. Mas é preciso ser fã, conhecedor até das letras menos festejadas, para embarcar neste show.

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