Cacilda https://cacilda.blogfolha.uol.com.br Blog de teatro Mon, 29 Nov 2021 21:38:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Zé Henrique de Paula rompe naturalismo e tira o melhor de Arthur Miller https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/08/10/ze-henrique-de-paula-rompe-naturalismo-e-tira-o-melhor-de-arthur-miller/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/08/10/ze-henrique-de-paula-rompe-naturalismo-e-tira-o-melhor-de-arthur-miller/#respond Fri, 10 Aug 2018 05:00:19 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/08/VY8A4867-320x213.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17113 Um Panorama Visto da Ponte
★★★★
Teatro Raul Cortez, r. Dr. Plínio Barreto, 285. Sex., às 21h30, sáb., às 21h, dom., às 18h. Até 25/11. Ingr.: R$ 80 (em ingressorapido.com.br). 14 anos

O que envolve aos poucos o espectador neste “Um Panorama Visto da Ponte” é a engenhosidade da trama e a robustez dos conflitos e temas levantados na montagem de Zé Henrique de Paula para a peça do americano Arthur Miller (1915-2005).

Desde “Urinal”, que foi a comprovação de sua habilidade como encenador, Paula se tornou um favorito de atores-produtores para a direção de peças estrangeiras de qualidade —como no também denso “O Pacto”, musical de câmara que faz curta temporada em São Paulo.

No caso de “Um Panorama Visto da Ponte”, o domínio da chamada carpintaria —a escritura teatral— por Miller é explorado intensamente.

O texto expõe a degradação das relações pessoais no ambiente de desemprego e miséria, como nas peças de Tennessee Williams ou nos filmes de Elia Kazan, também nos Estados Unidos do pós-guerra.

É sobre a vida no entorno das docas do Brooklyn, como vista por quem olha da ponte de mesmo nome, à distância, para o bairro então miserável de Red Hook —agora em estado avançado de gentrificação, com restaurantes, lojas e turistas apagando os miseráveis de Miller. O lugar onde tudo se passa poderia ser descrito como um cortiço ou até um barraco de favela.

Miller segura o mais que pode os confrontos físicos e as tensões sexuais, que parecem estar sempre em preparação, perto de acontecer, confundindo seguidamente o público. Paula faz o mesmo, segue as indicações e prepara diligentemente as armadilhas para o espectador.

Dito isso, algumas questões levantadas podem soar datadas, de um naturalismo próprio dos anos 1950, que se batia contra uma moralidade hoje esgarçada. Mas mesmo quando isso acontece o texto qualificado garante o interesse, no mínimo, pelo embate de desejos, de interesses.

Uma outra qualidade de Paula, como já se viu antes no policial de “Urinal” e outros, mas mais pronunciada agora, está na interpretação que adota, reforçando a quebra do naturalismo, com um acento nos gestos moldados, artificiais, para se contrapor às afetações realistas de Miller.

Os atores escapam assim dos clichês de Marlon Brando e semelhantes, embora para alguns deles em “Panorama”, mais inexperientes, o formalismo da atuação se torne por vezes pesado.

O cenário com contêineres não é especialmente imaginativo, embora reflita a brutalidade, sobretudo de Eddie, o protagonista. O mesmo se pode dizer dos figurinos, com a onipresente camiseta regata, nos Estados Unidos chamada comumente —e ofensivamente— de “wife beater”, agressor de esposa.

O melhor está mesmo nas atuações e no texto. E o impacto emocional maior, inevitavelmente, é com Sérgio Mamberti, que faz o advogado que narra a tragédia anunciada, tenta intervir para evitá-la e se comove por fim com ela, prostrado, impotente.

Rodrigo Lombardi mostra firmeza com o vaivém de seu contraditório, vulnerável e por fim desesperado Eddie.

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Dirigida por André Paes Leme, premiada ‘Agosto’ ganha ironia e velocidade https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/19/dirigida-por-andre-paes-leme-premiada-agosto-ganha-ironia-e-velocidade/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/07/19/dirigida-por-andre-paes-leme-premiada-agosto-ganha-ironia-e-velocidade/#respond Thu, 19 Jul 2018 04:06:15 +0000 https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/files/2018/02/VY8A4193-150x150.jpg https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=17049 Agosto
★★★★★
Sesc Consolação – Teatro Anchieta, r. Doutor Vila Nova, 245. Qui. a sáb.: 21h, dom.: 18h; até 5/8. R$ 12 a R$ 40. 16 anos.

Na versão adaptada e dirigida por André Paes Leme, a partir do texto premiado de Tracy Letts, “Agosto” é muito diferente daquele espetáculo da companhia Steppenwolf, de Chicago, que dominou a Broadway uma década atrás.

Era então um drama familiar angustiante, opressivo, na linhagem realista americana. Mas Letts, já então conhecido como autor de “Killer Joe”, uma das peças que reergueram com violência a dramaturgia anglo-americana nos anos 1990, não se restringe mesmo à tradição.

E nas mãos de Paes Leme os seus diálogos agressivos, com provocações praticamente a cada palavra, ganharam uma velocidade que não havia na encenação original de Anna Shapiro. É um dos motivos, além da edição, para ter perdido cerca de uma hora.

Persistem as investidas dramáticas das figuras familiares levadas à cena, mas o sarcasmo de suas falas agora resulta, muitas vezes, em comédia sombria.

O público paulistano, também tão diferente do nova-iorquino, tem espasmos de risos —e depois de lágrimas—, muitas vezes num crescendo que acaba tomando a sala, a partir de um primeiro espectador ou espectadora que não consegue mais se conter diante daquilo.

No Brasil, a peça perdeu parte do título e mesmo o que sobrou não faz maior sentido: Originalmente era “August: Osage County”, referência a um condado ao lado de uma reserva indígena em Oklahoma, entre o Sul e o Meio-Oeste dos Estados Unidos, de planícies áridas, secas, sobretudo no calor de agosto, no verão do hemisfério Norte.

Mas perder algumas tintas locais, no título e na dramaticidade, abriu “Agosto” para uma proximidade maior com os espectadores e também os atores brasileiros, até uma universalidade.

A própria opção por um palco praticamente vazio, sem a também premiada casa vazada em três andares que ocupava quase todo o palco e apequenava os atores do Steppenwolf, é um ganho, no fim das contas —e não só pela solução mágica de Paes Leme, com “sobreposição dos ambientes e simultaneidade das situações”.

Com um humor inesperado diante do que se conhecia, mas sem cair em farsa ou paródia, crescem a inteligência e as nuanças nos conflitos da mãe, Violet, de sua filha mais velha, Barbara, e da irmã da matriarca, Mattie Fae.

A atuação de maior impacto é de Guida Vianna como Violet. É em torno dela, de suas palavras e ações impiedosas e realistas, que gira o ciclone familiar de “Agosto”.

Seu vaivém de monstruosidades e revelações galvaniza não só os demais atores, mas os espectadores.

A antagonista é Leticia Isnard, que faz uma Barbara existencialmente frustrada em sua racionalidade e contenção, uma mulher e mãe com resultados não muito melhores que Violet. Chamada a enfrentar a mãe avassaladora criada por Guida Vianna, a atriz reage à altura, entremeando crueldade e compaixão.

A terceira nesta peça de personagens femininas devastadoras, Mattie Fae, é interpretada por Eliane Costa com perversidade ainda maior, em relação ao próprio filho, mas também com sagacidade.

Em poucos minutos de apresentação, registre-se, o elenco de 11 atores alcança um patamar alto de atuação coletiva, como um “ensemble” de fato, impressionando pelo conjunto tanto quanto pelas individualidades.

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Agora protagonista, Malu Rodrigues dá o tom e sustenta ‘A Noviça Rebelde’ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/05/04/agora-protagonista-malu-rodrigues-da-o-tom-e-sustenta-a-novica-rebelde/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/05/04/agora-protagonista-malu-rodrigues-da-o-tom-e-sustenta-a-novica-rebelde/#respond Fri, 04 May 2018 05:00:53 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=16883 CRÍTICA

“A Noviça Rebelde” se sustenta em grande parte na protagonista, na voz de Malu Rodrigues.

É uma encenação acentuadamente religiosa e tradicionalista, que consegue ser mais antiquada que o filme de 1965. A leveza que se permite está na Maria de Malu, agora —e cada vez mais— com amplitude de atriz, não só cantora, e em sua relação com as crianças menores.

De resto, o humor desta nova produção embarca até em vulgarização preconceituosa da homossexualidade. E a encenação mergulha numa suntuosidade que não condiz com a música original, de 1959, de Richard Rodgers e Oscar Hammerstein II.

O kitsch pomposo, de uma Broadway de caricatura, parece marcar uma nova fase do diretor Charles Möeller e do versionista Cláudio Botelho. O que havia de alegre e efusivo na dupla brasileira ficou pelo caminho, trocado por um conservadorismo amargo.

Mas se trata de uma das cinco grandes criações de Rodgers e Hammerstein, a dupla de compositor e letrista que mudou o musical americano, tornando-o mais complexo. E é aquele com mais “standards”, canções que marcam até hoje, entre elas “The Sound of Music”, “Do-Re-Mi”, “My Favorite Things” e “Edelweiss”.

A produção, aliás, perdeu a chance de recuperar o título “O Som de Música”, mantendo o que foi usado para o filme, “A Noviça Rebelde”. A opção sublinha a história, o libreto de Howard Lindsay e Russel Crouse, de longe sua faceta menos qualificada.

O roteiro é não só melodramático na forma, indo contra as mudanças de Rodgers e Hammerstein no gênero, mas reacionário no conteúdo. A crítica que faz ao nazismo se apoia no nacionalismo e no militarismo austríacos —sem questionar autoritarismo ou racismo.

A produção carrega ainda mais nas tintas sombrias, católicas, com os cenários de David Harris, os figurinos de Simon Wells e o coro de freiras.

Outro problema está no elenco principal. O teatro Renault foi o palco da retomada dos musicais no Brasil, com produções que formaram público e uma geração de estrelas do gênero, não celebridades emprestadas.

“A Noviça Rebelde”, agora, retrocede ao que o teatro comercial tem de pior no país, o apelo a atores de telenovela. É como se os musicais, até no palco que provou a sua viabilidade, não conseguisse mais andar com as próprias pernas.

O protagonismo de Gabriel Braga Nunes e Larissa Manoela no musical ecoa a projeção em folhetins de TV. Ambos têm qualidades já provadas no teatro, mas até Nunes deixa a insegurança à vista quando precisa soltar a voz.

Resta Malu Rodrigues, 24. Com uma década de trabalho em musical, iniciada como Louisa numa produção anterior de “A Noviça Rebelde” pelos mesmos Möeller e Botelho, ela segura o espetáculo. É quem dá o tom para os outros protagonistas. Bela, sensual, confiante e com aquelas notas altas, faz esquecer os deslizes.

A NOVIÇA REBELDE

★★★

Qua. a sex., às 21h; sáb., às 16h e 21h; dom., às 15h e 20h. Teatro Renault, av. Brig. Luís Antônio, 411, tel. (11) 4003-5588. R$ 75 a R$ 310. Livre

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Crítica: Divertido e inventivo, ‘Peter Pan’ abre temporada musical https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/03/27/critica-divertido-e-inventivo-peter-pan-abre-temporada-musical/ https://cacilda.blogfolha.uol.com.br/2018/03/27/critica-divertido-e-inventivo-peter-pan-abre-temporada-musical/#respond Wed, 28 Mar 2018 01:50:03 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://cacilda.blogfolha.uol.com.br/?p=16703 Nelson de Sá

Como escreveu o crítico Brooks Atkinson em 1954, sobre a estreia da adaptação musical americana para a peça inglesa de J.M. Barrie, é um espetáculo “enormemente divertido”.

Na encenação brasileira, talvez até mais —com voos ameaçadores sobre a plateia, de um Peter Pan acrobático agora feito por um ator, não atriz, e com jacaré mecânico. Uma superprodução para os padrões paulistanos e até para a Broadway original.

E tanta engenhosidade espetacular, devida em parte à produtora Renata Borges, mais participativa que o costume no Brasil, ainda assim é sobrepujada pela liberdade que encenação e elenco se permitem.

Atkinson, no New York Times, saudou em especial a “inventividade e delícia” com que o diretor e coreógrafo Jerome Robbins havia criado seus balés cômicos.

Pode-se afirmar o mesmo do diretor José Possi Neto e do coreógrafo Alonso Barros, que, a cada cena, parecem mais tomados pelo desejo de ombrear com o hoje lendário Robbins (1918-98).

O que fazem com Uga Uga, o segundo quadro do segundo ato, é talvez a melhor resposta contemporânea ao que o texto traz de mais datado —seu retrato preconceituoso dos índios americanos.

Não se escondeu nada, mas o delírio de movimentos que o Peter Pan de Mateus Ribeiro e sobretudo a Tiger Lily de Carol Botelho comandam no palco, na cena bastante estendida e que parece envolver todo o elenco, é avassalador, empolgante.

O público começa a aplaudir no meio do quadro, as crianças gritam, como se quisessem entrar no ritual frenético, quase um show à parte, com coreografias e arranjos que remetem para todo lado, cumulativamente.

A cena não deve ser creditada só a Possi, Alonso e seus 32 atores, mas também ao diretor musical Carlos Bauzys, costurando uma apoteose como poucas vezes se assistiu no gênero, no país.

E tem mais, em sofisticação criativa local, neste “Peter Pan – O Musical da Broadway”, na denominação usada no programa. Daniel Boaventura parece ter ido buscar nos seus primórdios no teatro, em plena comédia musical baiana dos anos 1980 e 90, as chaves para fazer do Capitão Gancho a estrela cômica da noite.

Suas cenas são ansiadas pelo público não só pela celebridade que ele alcançou nos musicais brasileiros mas pelo que abraça de humor desabrido e popular, desde a primeira aparição.

Não é possível mensurar o quanto Boaventura e seu “sidekick”, o agitado e engraçadíssimo Smee de Pedro Navarro, carregam da pantomima que inspirou J.M. Barrie (“panto”, a tradicional comédia popular inglesa, não simplesmente mímica), mas ela está presente na dupla.

Navarro e Carol Botelho são dois dos vários intérpretes de segundo plano ou do coro que parecem ascender por vezes à posição de protagonistas, dada a qualidade abundante no espetáculo, mas Bianca Tadini está sempre lá.

Mais que Peter, é sua Wendy que leva o público pela mão ou, melhor, pela voz, a mais aconchegante, afetuosa. Embala as crianças que se esforçam para chegar acordadas ao final das quase três horas da apresentação.

PETER PAN, O MUSICAL

QUANDO qui. e sex., às 20h30, sáb., às 16h e 20h, dom., às 17h; até 15/7

ONDE Teatro Alfa, r. Bento Branco de Andrade Filho, 722, tel. (11) 5693-4000

QUANTO R$ 50 a R$ 210

AVALIAÇÃO ótimo ★★★★★

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